tem, mas acabou #5 | vou voltar pra terapia
sobre quando a gente decide que chegou a hora de encarar os medos (ou ao menos um medo)
apesar de ser bastante da escrita, sou uma pessoa muito visual. nas aulas de canto, vivo explicando para o professor sobre como eu enxergo o movimento do som.
não tem nada de sinestesia, infelizmente, apenas uma questão da minha organização mental que talvez seja bem menos peculiar do que eu imagino.
na edição de estreia de tem, mas acabou, contei sobre o arquivo-de-ferro-cor-cinza-esverdeada-que-fica-no-fundo-da-minha-cabeça, levemente à esquerda. este é apenas um dos "lugares" que existem aqui dentro.
um dos outros é uma sala relativamente grande, de cor branca e cheia de portas ― algumas delas, fechadas — e luz difusa.
🔎 a news de hoje é sobre:
autoconhecimento
questões que precisamos (ou não) acessar
o senhor dos destinos
há alguns anos, passei por uma situação que pode ser descrita como traumática. decidi voltar para terapia para entender como lidar com o que restou em mim depois, mas nunca falei sobre.
é curioso pensar que eu tenha mantido esse trauma em segredo até da pessoa que procurei para me ouvir falar a respeito. deve haver alguma lógica aí, ainda que torta, porque também não contei para as minhas amizades mais próximas.
por uma ou duas vezes, joguei na mesa durante uma conversa de bar, sem pedir qualquer atenção especial para o assunto. fora isso, o máximo que consegui fazer até hoje foi criar monólogos em voz alta, quando protegida pela solidão.

decidi que essa seria uma das portas fechadas naquela sala pálida da minha mente por tempo indeterminado. aprendi que existem feridas que a gente não precisa cutucar.
pode ser que, eventualmente, a gente consiga passar a mão pela cicatriz e sentir uma dor que não nos faça perder as palavras, verter em lágrimas, ter uma crise ou que for. e aí a gente encara.
entender isso me trouxe uma paz valiosa, oposta à ansiedade que me fazia questionar o tempo todo: "será que conto pra psicóloga hoje?" ou "será que ligo pra Lígia essa semana pra conversar?".
foi assim que eu comecei a olhar para as portas fechadas que carrego aqui dentro sem sentir medo, tristeza ou uma angústia pulsante. enquanto a gente fala/lê/ouve sobre respeitar o tempo dos outros, precisamos conhecer nosso próprio tempo.
dia desses, notei que acima de uma das portas apareceu um relógio e entendi que era hora. não é a mesma porta do trauma sobre o qual ainda não falei, mas outra, que está pronta para ser aberta.
acredito muito no tempo como senhor dos destinos e acho que várias coisas acontecem dentro de um "timing" muito especial: tudo aconteceu depois que eu finalmente comecei a assistir ted lasso.
(fala sério, você não estava esperando por essa, né?!)
ted lasso é uma série maravilhosa que merece todos os emmy que ganhou até hoje.
trata-se de uma comédia dramática que acompanha a vida de um treinador de futebol americano que chega à inglaterra para treinar um time de futebol normal (risos) sem saber nada sobre o esporte.
aí o termo "coach" ganha duplo sentido, sendo que o segundo ― aquele de motivar e inspirar as pessoas ― é feito a partir de um viés muito mais humano, verdadeiro e palatável; em oposição aos oportunismos que inundaram as redes de baboseiras nos últimos anos.
todas as personagens-chave são igualmente envolventes e têm enredos bem construídos. além disso, há um importante fator chamado sotaque britânico, que amo com todas as forças.
ted lasso provoca risadas, mas as reflexões ficam com a gente por mais tempo. não de uma forma incômoda porque parecem nos atingir apenas na superfície, mas são capazes de adentrar em partes mais profundas da mente.
o mérito disso é da combinação de leveza dos diálogos e da forma inteligente de abordar questões cotidianas importantes sem esforço, tornando-as mais triviais. e foi nesse embalo que eu decidi voltar para a terapia ou fazer análise; ainda não decidi. estou em processo de busca.
ah, claro. em determinado momento da trama, uma psicóloga aparece para compor o elenco, mas juro que isso não me influenciou tanto.
no fim das contas, o que era o conforto da paz de uma porta fechada se transformou em inconformismo por sentir que é preciso (e um pouco urgente) elaborar a tal questão porque não é possível que a porta fechada seja ~mesmo~ minha melhor escolha.
é como se o atravessar dessa porta pudesse me levar a algo bem mais leve e bonito, e eu finalmente tivesse percebido isso.
realmente acredito que passar por essa porta ― o que envolve abri-la e lidar com o que me causa medo ― pode ter resultados incríveis. me atenho ao pode porque me sinto mais protegida na incerteza.
enquanto escrevo tudo isso, ecoa na minha cabeça uma das poucas frases que decorei muito cedo e nunca esqueci: "o que a vida quer da gente é coragem".
no fim das contas-número-dois, não decidi buscar terapia por causa de uma série, foi o timing. fazia tempos que eu queria assistir a ted lasso, mas quis o senhor dos destinos que eu só fizesse isso "agora" (há algumas semanas), quando a tal porta na minha mente já estava pronta para ser aberta.
é por essas e outras que o tempo tem de mim uma confiança que não deposito em qualquer “coisa”. até então, tem feito sentido.
e por aí, chegou o momento de encarar o quê?
tem pra hoje
informe 📈
metade da meta. prometi pra mim que chegaríamos à edição #10. estamos na metade da meta e quando alcançarmos a meta, vamos dobrar a meta. e vai todo mundo ganhar.
contexto adicional 🌈
um pouco sobre sinestesia. ao mesmo tempo que me parece legal, suspeito que pode ser meio… incômodo (?). mas acho que queria ao menos experimentar, se essa possibilidade existisse.
a lorde é uma das pessoas no mundo que tem sinestesia e acho que, de alguma forma, dá para "perceber" isso principalmente no primeiro álbum e nas apresentações ao vivo.
streaming 🍎
ted lasso está disponível no apple tv + que, diga-se, tem séries bem interessantes no catálogo. minha próxima será severance, você já viu?
atualização 😄
na edição passada, perguntei como traduzir tem, mas acabou para o inglês. [we] have it, but is over now e there's no more chegaram como sugestões. a ver, ainda não sei se realmente vou "investir" nisso.
acabou (ou quase)
não custa lembrar: se você gostou ou sentiu qualquer outra coisa que te deixou com vontade de comentar, me escreve 😄
e se você gostou muito e quiser recomendar para alguém, não pense duas vezes: só vai!
Ahhhhhh as portas... amo a analogia das portas pela simplicidade do invento em si. Pensa comigo, em algum tempo distante não havia portas. Tudo era meio que um loft perdido nos primórdios da História. Só de pensar me dá gastura rs. Sim, é mais uma noia minha: portas fechadas geram em mim uma curiosidade insuportável (deve ser por conta da minha alma de gato rs); portas semiabertas exercem um poder de sedução, podem tanto ser um convite pra entrar, quanto um alerta pra "permanecer distante", ou apenas espiar, ver recortes; as abertas não me dizem quase nada, e só agora me dei conta disso (Freud explica? Ou seria uma reflexão mais soturna, e mais adequada para Nietzsche?). Sei não...
O fato é que passo despercebida pelas portas abertas, assim como elas por mim. No plano prático, simbolizam - no meu singelo entendimento -, as oportunidades explícitas, convites genéricos... não me interessam. Chego a comparar as portas abertas a ciladas; afinal, "quando a esmola é muita, o santo desconfia".
O fato é que tenho cá nos recônditos da minha mente perturbada algumas salas com portas coloridas. Algumas trancadas a chave eletrônica, cuja senha eu nunca soube, ou fiz questão de esquecer. Outras semiabertas cujos interiores eu visito vez em quando, pra descansar dessa dor de ser a pessoa que sente e pensa demais; entro, deito no chão, arejo as janelas, troco plantas de lugar e me vou embora, apaziguada Não tenho portas abertas nos cantos secretos da cabeça. Não ocupo espaço com elas. Sobre a terapia, às vezes suspeito que apenas arranho superfícies de traumas que me aparecem em sonhos perturbadores de cannabis. Talvez esteja na hora de trocar a TCC pela psicanálise por um tempo. Como sempre, tenho a bênção de ter você na minha vida pra me lembrar do quão caótica é a minha alma rs. Te amo um absurdo.
5.
Severance é mto mto mto foda :)